Publicado originalmente em Gazeta de São Paulo em 21/07/2020
Vidas negras importam. Vidas quilombolas importam. Vidas indígenas importam. Vidas caiçaras, também importam. Muitos podem dizer que todas as vidas importam, o que não é mentira, mas vocês já perceberam que existe uma parcela da população que precisa reafirmar reiteradamente estas palavras, porque ao contrário dos demais, têm sua existência e sua integridade ameaçadas diariamente, sofrem preconceitos, violência, perseguição e até a morte?
No Brasil, temos visto a pandemia de Coronavírus atingir de forma desigual e implacável os negros, a população periférica e os povos tradicionais. São grupos que já sofrem com a violência do Estado, com a marginalização, a dificuldade de acesso aos serviços públicos, em especial o sistema de Saúde, e que agora se veem ainda mais fragilizados. Assim é também a realidade de muitos caiçaras, ainda que sua agonia não estampe a capa dos jornais.
É o mesmo processo de invisibilidade que sofrem os demais grupos marginalizados do nosso País, mas, na última semana, uma ação do governo do Estado de São Paulo, por meio da Fundação Florestal e da Procuradoria do Estado, adicionou requintes de crueldade nos conflitos com um grupo de caiçaras da Jureia, no litoral sul paulista. Acontece que a tentativa de remoção das famílias remanescentes de populações tradicionais da região foi retomada em plena pandemia.
Não é um fato novo, já que no ano passado o Estado já havia demolido ilegalmente duas casas de descendentes de moradores centenários da comunidade caiçara de Rio Verde, localizada onde está instalada a Estação Ecológica da Jureia-Itatins. Na ocasião, a Defensoria Pública obteve uma liminar a tempo de impedir a remoção forçada de uma terceira família caiçara remanescente.
Agora, na calada da noite e no auge da pandemia, querem cassar a liminar e, descumprindo leis, normas, tratados nacionais e internacionais, além de protocolos de saúde, terminar o crime que começaram. Por isso é importante reafirmar, diariamente, que vidas caiçaras importam!
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